Cinquenta Anos "Mulher, acorda mulher! Já passa da meia-noite.
O que é, Tião. Vamo dormir, tá tarde.
Você não tá lembrando? Hoje... cinquenta anos... Cinquenta anos de quê, Tião? De idade é que não é. Cinquenta anos, benzinho. Cinquenta anos que eu junto as minhas escovas com as da minha gatinha... É mesmo, Tião. Num tava lembrando mesmo. Também, essa memória gasta da gente... o tempo é miserável, o tempo come tudo.
O tempo passa, heim, minha flor? Cinquenta anos atrás eu era um rapaz airoso, sacudido, cheio de energia.........Se bem que eu ainda dou no couro, não dou, princesa?
Esmeralda esboçou um sorriso em meio a um bocejo e assentiu, maliciosa.
(trecho do conto "Cinquenta", do livro A Volúpia e as Algemas, do escritor Valdir de Aquino Ximenes) Bom, acabamos de ouvir um trecho de um conto do médico e escritor Valdir Ximenes, que escreveu um livro com histórias de sexo na terceira idade. O livro retrata momentos de união, prazer e descoberta, conflito, e também o sexo como força instintiva e algumas vezes destruidora. Ou seja, o autor retrata o sexo em todas as suas facetas. A diferença é que os personagens já passaram dos 60 anos.
Valdir Ximenes destaca que cada vez mais o envelhecimento não é problema para que as pessoas sigam experimentando uma sexualidade plena.
"Ao mesmo que você tem o culto ao corpo jovem, o culto à beleza magra, existe o contraponto, que é esse pessoal estar se mobilizando também para ter o seu espaço na sociedade, sexualmente falando também. E o erótico cabe em qualquer situação, qualquer idade." Se para os homens, o surgimento do Viagra reabriu as conversas sobre vida sexual na terceira idade, atualmente as mulheres também buscam o seu espaço.
Em seus contos, Valdir Ximenes também retrata histórias de mulheres idosas saindo com homens mais novos, e o escritor destaca que esse é um movimento visível nos dias de hoje.
"Você tem uma Suzana Vieira, que abertamente assume a sua sexualidade, o seu desejo por rapazes jovens. De certa forma, são exemplos que não surgem à toa. Você não tem uma Suzana Vieira à toa colocando isso. Tem toda uma vivência nas ruas, lógico que não de pessoas famosas, mas são pessoas comuns que de certa estão vivenciando aquilo também." É, a quebra de padrões está nas ruas, mas muitas vezes os conflitos que envolvem uma vida afetiva e sexual na terceira idade são bem mais simples.
A professora aposentada Iraci Fagundes, de 62 anos, é uma bela mulher, dona de um belíssimo par de olhos verdes.
Separada do marido há 18 anos, a filha mais nova frequenta a casa do pai, que vive com uma segunda mulher. Mas a filha não aceita o namoro de Iraci com um homem sessentão.
"É incompreensível esse ponto, ás vezes eu falo: olha, Marcela, é assim, e ela, tá bom, mãe. Mas quando eu digo "o Carlos vem almoçar aqui", ah, então vou pegar a minha bolsa e vou lá pra casa da vizinha. Eu digo, vá, pode ir. Se tiver com fome você vem almoçar. E fica nisso, eu não vou deixar de viver por isso. Então nós saímos, nós dançamos, brincamos, jogamos dominó juntos." Iraci conta que já fez reposição hormonal e que não sentiu uma queda no desejo sexual com o passar do tempo.
Para ela, o entrosamento e o carinho do casal são mais importantes do que as mudanças vindas com a idade.
"Eu acho que pode continuar bonito e interessante quando você gosta da pessoa realmente. Tem uma diferençam, sim, de homem pra homem, tem um mais carinhoso, tem um menos carinhoso, né? Apesar de não ser um casamento, apesar de ser só um companheirismo, eu acho o segundo assim com mais liberdade, mais carinhoso, entendeu?" O passar do tempo traz perdas e ganhos. Traz relações mais maduras e carinhosas, e também a perda dos parceiros.
Seu Santana ficou viúvo há 15 anos e durante um período ficou mais caseiro, fechado aos relacionamentos. Mas se permitiu voltar a conhecer pessoas e se divertir.
"Ela foi pra lá e eu custei muito a me adaptar. Eu tenho uma área coberta e ficava parecendo um papagaio no arame, indo pra lá, pra cá, pra lá. Aí um dia uma pessoa me falou: rapaz, por que você não vai na terceira idade? Eu vim. Cheguei aqui comecei a gostar, comecei a passear, me tirou daquele estresse, daquela solidão que eu tinha. Você conversa com muita amizade com as pessoas, e aqui e acolá dá um namoro." E quando o assunto é sexo, seu Santana, hoje com 80 anos, não fica de enrolação. Ao lado da namorada, em um baile para a terceira idade, assume que toma remédios para disfunção erétil. Ele só reclama é do preço.
"Mas o sexo, aí vai ser preciso arrumação.... medicamentos caríssimos. O senhor toma algum remedinho? Tomo. Dizem assim: e Viagra como é que fica? Mas o Viagra já caiu de moda, agora vao tomar o Cialis, já tem mais outros. Pra você ter uma ideia, custa 120 reais quatro comprimidinhos. Pois é, 120 reais quatro comprimidos de Viagra. Mas aquilo que eu faço pra mim, que tenho gosto em fazer, estou empregando em mim, eu não tô gastando, tô investindo, investindo em mim, como qualquer outra pessoa. Investindo na minha alegria, na minha vida, no que eu acho bom." E esses medicamentos realmente não são para qualquer homem. Além do alto preço, é fundamental que o homem tenha um acompanhamento médico constante.
Tomar medicamentos para disfunção erétil por conta própria pode trazer riscos muito sérios para a saúde.
E as mulheres também devem buscar orientação médica para se adaptarem às mudanças do corpo após a menopausa. Vamos falar mais disso na próxima reportagem.
De Brasília, Daniele Lessa